Segurança
Morte de diretor do Degase retoma debate sobre porte de arma
Possibilidade depende de decisão do Supremo Tribunal
A morte do diretor do Centro de Recursos Integrados de Atendimento ao Adolescente (Criaad) da Ilha do Governador, Zona Norte do Rio, unidade do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase), Thiago da Costa, ocorrida na última segunda-feira (21), reacendeu o debate sobre o porte de armas para os agentes da categoria. O recurso foi retirado por uma decisão do Tribunal de Justiça no ano passado, a pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), quando magistrados consideraram não haver respaldo na constituição.
Para João Rodrigues, presidente do Sindicato dos Servidores do Degase (Sind-Degase), a arma seria uma forma de defesa contra possíveis abordagens de criminosos. Segundo ele, a morte de Thiago poderia ser evitada caso existisse a permissão para o armamento.
"O Thiago é mais um profissional de segurança que a gente perde dentro do Degase. A Justiça recentemente embargou o nosso porte de arma e estamos sem direito de defesa. O Thiago talvez, se tivesse esse direito, ele teria uma chance de se livrar daquela situação. Infelizmente, é uma tragédia já anunciada. Um servidor do Estado que cruza o muro e fica a mercê da própria sorte", lamentou João.
Arma seria uma forma de defesa contra possíveis abordagens de criminosos
Ao ENFOCO, o presidente informou também que a seccional do Rio da OAB entrou com um pedido junto ao Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ) para anular uma lei estadual que permitia o porte de armas desses agentes. No ano passado, cerca de 200 funcionários do Degase tiveram que devolver os certificados que oficializaram o porte.
Nesta terça-feira (22), dia do sepultamento do agente, profissionais da unidade socioeducativa realizaram um protesto em frente ao Palácio Guanabara em busca de pedir algumas medidas, entre elas progressões salariais atrasadas e o uso de armas fora do ambiente de trabalho.
"Está mais do que comprovado, através do Thiago e de outros agentes que nós perdemos nos últimos anos, que o porte de arma é um instrumento de defesa que o agente do Estado tem que ter. Ele não pode cuidar da segurança pública, de pessoas que não estão em condições de viver em sociedade e ficar refém da própria sorte quando cruza esses muros", finalizou.
O Thiago talvez, se tivesse esse direito, ele teria uma chance de se livrar daquela situação. Infelizmente, é uma tragédia já anunciada
Procurada, a OAB-RJ ressaltou que a decisão de impugnar a Lei foi tomada pelos magistrados do TJ-RJ que consideraram inconstitucional a medida estadual.
Entenda
Em 2019, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) aprovou a Lei Estadual número 8.400/2019, de autoria do deputado Marcos Muller (Solidariedade), na época filiado ao PHS. O texto foi sancionado e publicado em Diário Oficial pelo então governador Wilson Witzel, que foi deixou o cargo após impechment no ano passado.
Segundo o texto, os agentes ativos e aposentados do Degase teriam o direito de portar armas de propriedade particular e uso fora do ambiente de trabalho, desde que atuem no regime de dedicação exclusiva, comprovem capacidade técnica e aptidão psicológica e passem por mecanismos de fiscalização e de controle interno. A medida também determinava que as armas deveriam ficar guardadas em locais seguros quando os agentes estivessem em serviço.
No entanto, o TJ-RJ julgou em 2021 a lei como inconstitucional. Os magistrados consideraram que o Estado invadiu a competência da União, única que pode legislar sobre a questão do porte de armas. A relatora do caso, desembargadora Maria Angélica Guimarães Guerra Guedes, ressaltou que a norma autorizava o aumento do número de armas nas unidades socioeducativas, o que colocava em risco internos e servidores.
De acordo com a justificativa do tribunal, a Constituição não enxerga os agentes socioeducativos como um órgão de segurança pública.
"Ademais, esteia que os agentes socioeducativos não possuem poder de polícia ou atribuição legal para atuar como se Órgãos de Segurança fossem. Nesta linha de intelecção ressalta que, de acordo com o SINASE, a atividade do agente de segurança socioeducativo consistiria em “zelar pela integridade física e moral do interno, cuidar de sua cuidar de sua segurança, alimentação e higiene pessoal, conduzi-lo para suas audiências, a hospitais ou outras instituições, contribuir para o retorno a sociedade e ajudá-lo nas etapas de sua reeducação”, não se confundindo, pois, com aquela desempenhada pelos agentes penitenciários", diz o processo.
O responsável por gerenciar o departamento é a Secretaria Estadual de Educação, mesmo com o pedido dos agentes de ingressar no setor da segurança pública. A Alerj e o Sind-Degase entraram com um processo para embargar a decisão do TJ-RJ em fevereiro deste ano, mas ainda não obtiveram resultados.
Âmbito Federal
O deputado federal Felício Laterça (União Brasil-RJ) já declarou publicamente ser a favor do armamento para os agentes socioeducativos. Em declaração ao ENFOCO, o parlamentar informou que houve vários projetos de leis consolidados sobre o assunto, inclusive, a Comissão Especial da Câmara dos Deputados já aprovou o Estatuto de Controle de Armas de Fogo, em substituição ao Estatuto do Desarmamento (Lei 3722/2012).
O texto aprovado, um substitutivo do ex-deputado Laudivio Carvalho, estende o porte de armas para outras autoridades como deputados, senadores e agentes de segurança socioeducativos. Também reduz de 25 para 21 anos a idade mínima para a compra de armas no país e retira os impedimentos para que pessoas que respondam a inquérito policial ou a processo criminal possam comprar ou portar arma de fogo.
Contudo, o porte de armas para agentes do Degase seria funcional. De acordo com a Câmara dos Deputados, esse tipo de porte assegura a possibilidade de autoridades portarem arma de fogo em razão do cargo ou função que exercem. Essa licença é válida tanto para armas de uso permitido quanto de uso restrito. O porte funcional tem tempo específico apenas durante o exercício do cargo, função ou mandato, devendo a arma ser devolvida em até 30 dias úteis após o fim da atividade.
A Câmara dos Deputados acrescenta que o porte funcional fora de serviço nos casos em que é permitido apenas o porte duranrte as atividades, só será autorizado se ficar comprovado risco à integridade física. O deputado Felício Laterça explica que dentro do estabelecimento prisional não se pode andar armado, mas fora da unidade o agente teria esse direito. O deputado complementa que a possibilidade seria uma forma de proteção.
"Eu acho mais que necessário. Os agentes lidam com menores que são violentos. A própria falta de maturidade desses menores pode gerar uma reação com relação a esses profissionais. Quando um menor entra no mundo do crime, ele não tem maturidade o suficiente. Logo, os seus atos em regras são impensados, o que deixa os agentes socioeducativos que cuidam deles em uma situação vulnerável. Já passou a hora de conferir o porte de arma para esses agentes que eu entendo que integram a segurança pública", opinou.
Mesmo com a aprovação pela Câmara dos Deputados, ainda não houve uma votação no plenário para poder transformar o substitutivo em lei sancionada. Agentes aguardam a votação no Supremo Tribunal Federal (STF), que ainda não tem previsão de acontecer, para saber se podem ou não portar armas fora do serviço.
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