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    Indignação

    Traficantes cortam internet em São Gonçalo e Itaboraí

    Problema afeta moradores e comerciantes das duas cidades

    Publicado 01/07/2024 às 6:37 | Atualizado em 01/07/2024 às 7:25 | Autor: Lucas Luciano, Dayse Alvarenga e Tiago Souza
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    Segundo relatos, o objetivo é obrigar moradores e comerciantes a usar a internet fornecida por eles
    Segundo relatos, o objetivo é obrigar moradores e comerciantes a usar a internet fornecida por eles |  Foto: Péricles Cutrim

    Ordenado pelo tráfico, o corte de internet na Região Metropolitana do Rio tem preocupado moradores e comerciantes das cidades de São Gonçalo e Itaboraí. O problema afetou diversos bairros dos respectivos municípios, incluindo Covanca, Pita, Barro Vermelho, Vila Brasil, Manilha e Marambaia - que chegaram a ficar sem internet por mais de 10 dias.

    Segundo relatos, a interrupção está sendo realizada por criminosos, com o objetivo de obrigar moradores e comerciantes a usar a internet fornecida e financiada por eles. Além de não ter outra opção viável, muitos se sentem coagidos a não registrar ocorrências na delegacia ou reclamar da situação, por medo de represálias.

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    É desesperador ver clientes indo embora.
    Comerciante anônimo.
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    "Estamos há mais de uma semana sem internet, o que prejudica gravemente nossas operações. Não podemos realizar pagamentos com cartão, afetando diretamente nossas vendas. É desesperador ver clientes indo embora por falta de opções de pagamento", relatou um proprietário de comércio no Pita, em São Gonçalo, que preferiu não se identificar.

    A situação se agrava em uma outra loja próxima. Com receio de prejudicar as operações, o proprietário teve que adotar a conexão de internet disponibilizada pelos traficantes.

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    Alguns homens ofereceram uma solução alternativa.
    Comerciante anônimo.
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    "No início, ficamos paralisados. Sem acesso à internet, não emitíamos notas fiscais nem mantínhamos registros de inventário. No entanto, alguns homens ofereceram uma solução alternativa. Optamos por adquirir essa nova conexão para retomar nossas operações essenciais", explicou o proprietário, que preferiu não divulgar detalhes por motivos de segurança.

    Nas residências da região, a falta de internet está causando angústia
    Nas residências da região, a falta de internet está causando angústia |  Foto: Péricles Cutrim

    Problema também afeta as residências

    Os relatos dos comerciantes são apenas parte do problema. Nas residências da região, a falta de internet está causando angústia e isolamento digital. Na Covanca, uma moradora compartilha sua frustração.

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    É um retrocesso enorme em nossa vida diária.
    Moradora anônima.
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    "Estamos há mais de uma semana completamente sem internet. Não conseguimos pagar contas online, e meus filhos estão enfrentando dificuldades com atividades escolares que dependem da conexão. É um retrocesso enorme em nossa vida diária. E o pior é que não temos a quem reclamar sobre a situação, pois o medo de sofrer represálias é grande", afirmou ela, anonimamente.

    No Pita, outro morador lamenta os impactos severos em seu trabalho e vida cotidiana.

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    Infelizmente, não posso mudar de provedor.
    Morador anônimo.
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    "Desde que o serviço de internet da Claro falhou em casa no dia 18, estou completamente paralisado. Meu trabalho, minhas pesquisas de campo e até a televisão que assisto dependem da internet. Estou isolado em um mundo onde não sabia ser tão dependente de uma conexão. Infelizmente, não posso mudar de provedor porque é o único serviço disponível no bairro, Ou pelo menos era", disse ele.

    Cenário parecido em Itaboraí

    Moradores de vários bairros de Itaboraí também denunciaram que os traficantes colocaram, no início de junho, um panfleto ordenando que a população siga a orientação deles para troca da empresa prestadora de serviço de internet. Além da ordem, os criminosos teriam quebrado equipamentos já instalados para colocar cabos de internet privada do tráfico.

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    A que a gente usava antes até parou de funcionar.
    Morador anônimo.
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    "Colocaram o panfleto, e a que a gente usava antes até parou de funcionar. Deve ser provavelmente por isso", contou uma moradora que, além pedir para não ser identificada, solicitou até o anonimato do bairro onde mora por absoluto medo.

    Questionada pela reportagem do ENFOCO se ela ainda tinha o panfleto, a jovem disse que jogou fora. Outro morador, do mesmo bairro, revelou ainda a violência dos traficantes.

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    Quebraram as caixas de internet para colocar os cabos deles.
    Moradora anônimo.
    Aspas da citação

    "Eles (traficantes) cortaram a internet da empresa que nos atendia e quebraram as caixas de internet para colocar os cabos da operadora deles", disse.

    Já uma moradora, de outro bairro, narrou ainda que as ordens do tráfico para indicar prestadoras de serviços públicos no municípío não é novidade.

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    Não podemos escolher a operadora.
    Morador anônimo.
    Aspas da citação

    "A internet é a que o tráfico permite, pelo menos há cinco anos. Não podemos escolher a operadora. Agora, a gente recebeu um comunicado da empresa que nos atendia, via WhatsApp, simplesmente dizendo que não estaria mais atuando e que outra assumiria. Sem nenhuma explicação do porquê", explicou a moradora.

    O que diz a polícia

    Segundo a Polícia Civil, a 71ª DP (Itaboraí) está ciente das denúncias e iniciou uma  investigação para identificar e prender os responsáveis. A polícia disse ainda que as empresas que passaram a prestar serviço nas localidades relatadas nas denúncias serão investigadas.

    Prejuízos

    Questionada, a Conexis - associação das principais operadoras de telecomunicações, não comentou sobre a ação do tráfico. Mas falou sobre a onda de frutos nos bairros citados em São Gonçalo.

    "O furto, roubo, vandalismo e também a receptação de cabos e equipamentos causam prejuízo direto a milhões de consumidores todos os anos, que ficam sem acesso a serviços de utilidade pública como polícia, bombeiros e emergências médicas".

    O setor de telecomunicações diz que "defende uma ação coordenada de segurança pública envolvendo o Judiciário, o Legislativo e o Executivo, tanto o federal, quanto os estaduais e municipais, e a aprovação de projetos de lei (PL 5846/16, PL 4997/19 e PL 3780/2023) que aumentem a punição para esses crimes e ajudem a combater essas ações criminosas".

    Aumento no roubo de cabos

    Durante o ano de 2023, mais de 5,4 milhões de metros de cabos de telecomunicações foram roubados e furtados em todo o Brasil, segundo dados reunidos pela Conexis Brasil Digital. A entidade que representa as maiores operadoras de telecomunicações do país aponta ainda que o volume de cabos subtraídos no ano passado aumentou 15% em relação ao ano de 2022, quando foram roubados e furtados 4,7 milhões de metros.

    "A quantidade de cabos furtados e roubados no ano passado seria suficiente para cobrir a rota entre as cidades de Fortaleza, no Brasil, e Lisboa, em Portugal. As duas cidades estão a 5,7 mil quilômetros de distância uma da outra", comenta.

    Essas ações criminosas causaram prejuízo direto a mais de 7,6 milhões de pessoas.Sem acesso a serviços de telecom, esses usuários podem ser impedidos de acionar serviços públicos importantes para o dia a dia como polícia, bombeiros e emergências médicas.

    "Além disso, há prejuízo econômico direto para milhares de negócios que podem deixar de funcionar", enfatiza a associação.

    Para a diretora de Relações Institucionais e Governamentais da Conexis Brasil Digital, Daniela Martins, é preocupante essa alta registrada no volume de cabos roubados.

    "Mais alarmante ainda é que acompanhamos seguidos aumentos nestes números nos últimos anos. A conectividade é um serviço essencial, cada dia mais importante na vida das pessoas e das empresas e esses crimes não podem ser vistos como de menor gravidade”, afirmou.

    O que diz a Anatel

    Ouvida, a Anatel informou que analisando as queixas de banda larga fixa para os municípios de Itaboraí e São Gonçalo, registradas entre janeiro e maio de 2024, não é possível notar aumento de reclamações nesse ano. 

    A entidade recomenda que o consumidor procure primeiramente sua prestadora para resolver o problema. É ela quem presta diretamente o serviço e tem obrigação de responder todas as demandas. Caso o problema persista, o consumidor deve buscar a Ouvidoria da prestadora, que funciona como instância superior de atendimento dentro da própria empresa.

    Nos casos de indisponibilidade dos serviços, a Anatel informa que "os consumidores devem entrar em contato com as suas operadoras e fazer a solicitação do ressarcimento do período em que ficaram sem a prestação do serviço. As prestadoras são obrigadas a ressarcir os consumidores pelo período em que ficaram sem serviço. Informações detalhadas podem ser obtidas na seção 'Ressarcimento Automático' da página Interrupções de Serviço e Ressarcimento". 

    Recomendações 

    Se ainda assim o problema não for resolvido, o consumidor pode registrar reclamação na Anatel, de posse de seu protocolo de atendimento da Ouvidoria da prestadora. Informações adicionais referente ao procedimento podem ser obtidas acessando o endereço eletrônico.

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