Bebês achados em fossa de lar católico serão exumados

Onze anos após a descoberta de uma fossa comum no terreno de um antigo abrigo para mães solteiras em Tuam, no oeste da Irlanda, o governo iniciou nesta segunda-feira (16) os primeiros trabalhos de preparação para a exumação de 796 crianças e bebês. As escavações estão previstas para começar em julho.

A área começou a ser delimitada após anos de mobilização de familiares, ativistas e pesquisadores que cobram justiça e reconhecimento para as vítimas. O abrigo, conhecido como Lar Santa Maria do Bom Socorro, funcionou até 1972 sob administração de uma ordem de freiras católicas. O local recebia mulheres grávidas que não eram casadas, numa época em que a moral conservadora irlandesa impunha forte repressão social a mães solteiras.

Descoberta

A existência das ossadas foi revelada em 2014 graças ao trabalho da historiadora Catherine Corless, que identificou centenas de mortes infantis ao analisar registros da instituição. Segundo os documentos, as vítimas tinham entre recém-nascidos e nove anos de idade. Corless apontou que os corpos estavam enterrados em uma antiga fossa séptica.

Durante sua pesquisa, a historiadora enfrentou resistência por parte da comunidade local e autoridades. Em entrevistas, ela relembra as dificuldades: “Muitas pessoas em posição de autoridade queriam apenas erguer um monumento e esquecer o que aconteceu ali”, disse ao jornal The Irish Times.

Apesar das críticas e da pressão para desistir, ela seguiu adiante. “Saber que aqueles bebês estavam em um sistema de esgoto me deu forças para seguir”, relatou.

Investigação oficial e reconhecimento tardio

A divulgação do caso obrigou o governo irlandês a criar uma comissão de investigação sobre os chamados “lares para mães e bebês”. O relatório final, publicado em 2021, expôs a gravidade da situação: cerca de 9 mil crianças morreram nas 18 instituições analisadas, entre as quase 60 mil que passaram por esses locais ao longo de décadas.

O processo de exumação será liderado por Daniel MacSweeney, diretor da operação. Ele classificou a tarefa como “única e extremamente complexa”, uma vez que envolve a identificação dos restos mortais e o contato com famílias possivelmente envolvidas. A previsão é de que os trabalhos durem aproximadamente dois anos.

Silêncio e expectativa das famílias

A demora no início da exumação se deveu principalmente à espera pela conclusão da investigação oficial. Durante décadas, o tema foi tratado com silêncio tanto pelas autoridades quanto pela comunidade local. Os lares para mães solteiras, como o de Tuam, funcionaram em parceria entre o Estado irlandês e a Igreja Católica.

As mulheres, muitas delas enviadas pelas próprias famílias, eram forçadas a dar à luz longe dos olhos da sociedade e frequentemente separadas de seus filhos, que eram destinados à adoção, muitas vezes sem consentimento.

Para os familiares das vítimas, a abertura da fossa representa um marco histórico no reconhecimento dos abusos cometidos. Anna Corrigan, cujo dois irmãos, John e William Dolan, podem estar entre os enterrados, destacou a importância da medida: “É uma tentativa de corrigir um erro que nunca deveria ter acontecido”, afirmou.