Erika Figueiredo - Filosofia de Vida
Surge uma nova civilização?
Vocês podem se questionar, com frequência, sobre se a civilização está, realmente, em crise e prestes a desaparecer, nos moldes pelos quais foi criada e mantida, ao longo dos séculos. Afinal, aparentemente, exceto pela pandemia, o mundo continua funcionando, e o apocalipse zumbi não aconteceu.
Entretanto, fato é que, se olharmos com atenção, direitinho, veremos que há uma crise de proporções inimagináveis acontecendo, bem diante dos nossos olhos. Trata-se de uma crise que vem removendo, paulatinamente, os valores que eram os pilares da nossa sociedade: família, religião e educação vêm sendo atacados, sem misericórdia, desde a segunda metade do século XX.
O mundo, após quase ser destruído por duas guerras mundiais, tendo, ainda, outras guerras como pano de fundo, passou a funcionar de outro modo... Movimentos progressistas ganharam voz, e aqui e ali, passaram a pipocar bandeiras sobre feminismo, homossexualidade, sexo livre, uso e liberação das drogas, divórcio, aborto, desarmamento, dentre outros.
Essas pautas buscavam demonstrar que o Ocidente, do modo que vinha se conduzindo, até então, havia se colocado na situação atual, e que era preciso promover mudanças drásticas na sociedade, a fim de que se pudesse viver com paz e liberdade.
Exaustas após tantas guerras, as pessoas acreditaram naquilo, e supuseram que o mundo precisava de novos valores e parâmetros. Foi algo bem parecido com a crença cega em Hitler, pelos alemães, que levou-os a concordarem com as atrocidades cometidas pelo seu Fuhrer. Hoje, com o mesmo raciocínio de “seguir o líder” , chegamos ao fundo do poço.
E como surgiram essas pautas, encontrando eco na sociedade? Para compreendermos isso, precisamos voltar um pouco no tempo, até a década de 30 do século 20, quando Antonio Gramsci, um ideólogo marxista italiano, escreveu, enquanto estava preso, seus Cadernos do Cárcere, influenciando todas as gerações seguintes de intelectuais de esquerda.
No que consistiam esses cadernos? Tratavam-se de manuscritos, nos quais Gramsci explicava que, para dominar-se uma sociedade, mais eficazes do que as armas, são as idéias. Noções progressistas, as quais minassem as instituições da escola, da família e da igreja em seu âmago, desfazendo os valores morais e inegociáveis das pessoas, seriam a porta de entrada para a criação de um novo sistema global de poder.
A disseminação do caos, por meio de movimentos sociais pré-constituídos por minorias, viria ao encontro das idéias de Gramsci, como o modo adequado de sensibilização da sociedade ocidental. Como assim?
Exemplifico de modo simples, por meio da figura do homem moderno. Por meio de um discurso de igualdade entre os sexos, inferioridade da mulher, supremacia masculina, direito ao sexo livre e ao aborto, além das mesmas condições salariais, as mulheres iniciaram uma cruzada contra seus parceiros, os divórcios explodiram e as famílias restaram para sempre comprometidas.
Após o rompimento da estrutura familiar, e sem qualquer prática de vida adulta fora do casamento, as partes envolvidas foram perdendo-se pelo caminho, a criação e a educação dos filhos restaram prejudicadas, já não se ia mais à igreja, por inadequação social da figura de divorciado ao meio anterior... isso gerou uma bola de neve na sociedade.
Na educação, ideólogos como Paulo Freire foram recepcionados de forma integral, passando a ser questionada a autoridade da escola, a capacidade de educar e formar cidadãos, e inserindo-se conceitos como o da livre escolha do aluno (construtivismo) e da individualidade sobrepondo-se ao coletivo.
Indo para a universidade, as ideologias foram prontamente recepcionadas e replicadas, uma vez que acharam, ali, terreno fértil para florescer, por ter o jovem o inconformismo em sua natureza.
Família e educação claudicando, mal das pernas e sem recepção no seio da sociedade, era a vez de destruir os valores religiosos. A igreja sofreu um baque quase mortal, com a chegada do progressismo e dos movimentos “modernos”. Teve seu valor e sua História aniquilados pela narrativa marxista, a qual creditava aos clérigos o enriquecimento ilícito e a pederastia, a homossexualidade enrustida e a devassidão, por detrás das portas das igrejas, mosteiros e conventos. Não sobrou quase nada a defender do catolicismo.
Mas então, em tendo sido os três pilares da civilização quase que eliminados da cena social, o que restou? Ao que me parece, depressão, inadequação, vazio, caos, falta de identidade, conflitos de todos os tipos, vícios e uma vida sem sentido, repleta de hedonismo e egoísmo.
Porque, sem os valores e virtudes cardeais, quando em um momento de guerra, epidemia, fome, tragédia ou morte, onde iremos nos amparar? Sem uma família, uma religião ou a sabedoria para nos acolherem, confortarem e nos ajudarem a seguir de pé, o que será de cada um de nós?
Se foi assim que a Humanidade sobreviveu e avançou, qual é o objetivo de modificar isso? Se os valores inegociáveis da sociedade advêm desses pilares, qual é a razão de ser desse rompimento? Por essas e outras perguntas que ficam sem resposta, que começou-se a falar de uma nova ordem mundial, na qual o mundo, orquestrado por metacapitalistas, está rumando para o caos.
O medo desmedido da morte e a falta de coragem, frente às intempéries, refletem a perda dos valores e virtudes morais, necessários à Humanidade. O ódio disseminado de forma constante, a polarização, os “cancelamentos”, a linguagem neutra, as narrativas falsas, tudo isso leva a sociedade para um buraco negro e sem retorno.
É preciso pensar sobre isso. A civilização caminha para um abismo. O que poderá nos salvar? Como ficará o mundo amanhã? Quais serão os novos valores recepcionados? Essas e outras perguntas seguem sem resposta para mim. “1984, de George Orwell, é a expressão de um sentimento, e é uma advertência. O sentimento que expressa é de quase desespero acerca do futuro do homem, e a advertência de que, a menos que o curso da
História se altere, os homens do mundo inteiro perderão suas qualidades mais humanas, tornar-se-ão autômatos sem alma, e nem sequer terão consciência disso”. Posfácio do livro.
O livro 1984, escrito em 1949 por George Orwell, seis meses antes de falecer, nunca foi tão atual.
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