Reflexão
O Jardim das Minhas Aflições
Uma análise sobre a obra do professor Olavo de Carvalho
O 'Jardim das Aflições' foi o segundo livro do professor Olavo de Carvalho que eu li. O primeiro foi 'O Mínimo que Você Precisa Saber Para Não Ser Um Idiota'. Como O Mínimo é uma coletânea, o primeiro contato mais profundo que tive com o encadeamento de ideias do autor, a fim de construir um texto coeso e fluido, foi lendo O Jardim. E fiquei encantada.
O livro descreve a perplexidade do autor, com uma palestra de José Américo Motta Pessanha, ministrada em 1990 no MASP, e foi escrito imediatamente após assisti-la, em uma só noite. A palestra em questão se chamava O Jardim das Delícias, e falava de Epicuro e sua filosofia.
A partir de um prólogo em que faz essa pequena apresentação, do modo como o livro surgiu, o professor Olavo faz a mágica acontecer. Digo isso, porque ele passeia por Epicuro e seu materialismo, chegando ao cientificismo e o historicismo atuais, não se esquecendo de Marx, Hegel, Cesar e do comunismo, sem entediar ou confundir o leitor. Ao contrário, conduz-nos através dos tempos e da filosofia, permitindo-nos compreender como chegamos ao fundo do poço, em que nos encontramos.
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Em sua descrição, Olavo vai esclarecendo que existe, no mundo atual, toda uma metodologia, para o domínio da mente humana, e que o tripé dos bens mais perseguidos: sexo-dinheiro-poder é o que serve de isca, para a escravização das massas e o afastamento de seu juízo reflexivo, de seu senso moral, de seus valores mais caros.
Ele também entende que tirar o sobrenatural, o imanente, o espiritual do centro das vidas dos homens – algo que existiu desde a Antiguidade, até o Renascimento, como pensamento único – e colocar nas mãos da História e da ciência a explicação de todos os fatos, foi uma estratégia para a colocação do Estado e da economia no lugar de Deus, criando um novo modo de viver, de pensar e desconsiderando completamente o sentido da vida, algo tão caro e norteador dos atos, dos antigos.
Nesse cenário, Epicuro, um cara medíocre e desprezado, ao tempo de Aristóteles, ganhou força na modernidade, pelo seguinte motivo: A filosofia de Epicuro é pródiga, na construção de esquemas mentais fantasiosos, que tragam boas sensações e bons pensamentos, ainda que não correspondam à realidade.
Afinal, sua solução para as mazelas da época, em que os grandes filósofos foram perseguidos e a liberdade de expressão foi cassada, em Atenas, foi que as pessoas se refugiassem em seu jardim das delícias, vivendo de prazeres e desejos sem fim. Para ele, a morte extinguia a alma, não havendo qualquer sentido em buscar uma evolução pessoal.
Em um momento de política ditatorial e perseguição feroz aos opositores do sistema, Epicuro, que era feito de chacota pelos filósofos da Antiguidade, foi elevado, pela sociedade aristocrática, à condição de um deles, como é típico dos momentos em que o pensamento é patrulhado: o circo dos idiotas prospera, em meio à impossibilidade de os homens sábios e cultos dizerem o que pensam.
Aristóteles e muitos outros já haviam saído de Atenas. E assim, Epicuro encontrou terreno fértil, para disseminar suas ideias toscas e dissociadas da realidade. Defendia que a vida terrena era a única possível, e seu objetivo esgotava-se em si mesma . Portanto, todo tipo de gratificação e gozo deveria ser perseguido insaciável e inesgotavelmente.
Epicuro e Marx
Dito tudo isso, o professor Olavo questiona como o palestrante, ali em 1990, na USP, teve a desfaçatez de incensar Epicuro no altar dos grandes filósofos da antiguidade, de influenciador de todo o pensamento filosófico de sua época. A partir daí, faz o autor um link entre essas ideias e filosofia de Karl Marx, que bebeu da fonte de Epicuro, na juventude, e teve muitas de suas ideias materialistas, ateístas e deturpadoras da realidade, influenciadas por ele.
Marx pregou um sistema de governo e de política, para as sociedades, absolutamente inviável, mas defendido por ele e por seus seguidores, com unhas e dentes, mesmo quando os horrores do que se fazia, a fim de garantir a hegemonia do Comunismo, vieram à tona, como os assassinatos em massa, a fome na Ucrânia, o regime sanguinário de Stalin.
Para se dissociarem da figura de Stalin, os comunistas passaram a sair em defesa do Socialismo, como se este não bebesse da mesma fonte do regime anterior, e não precisasse dos mesmos horrores antes praticados, a fim de manter a ordem e a obediência ao Estado, a qualquer preço. Surgia o Estado como Deus, tese já defendida por Hegel, tempos antes.
Nosso querido mestre, em seu livro, nos premia com um passeio pela filosofia antiga, a medieval, a eclesiástica e a moderna, demonstrando que a busca por algo que ultrapasse a vida terrena e não se esgote na matéria foi, desde sempre, uma grande questão filosófica, e a razão de ser da evolução humana: se não houvesse nada maior do que nós, por que evoluiríamos?
No entanto, com a criação das Universidades por grupos de estudiosos, e dos ensinos palacianos para a nobreza, começou uma onda de desprezo pelo que fosse associado a Deus e à criação, além da contestação da história bíblica, que passou a ser substituída por uma ciência histórica. O cristão defende que o homem é um universo em si mesmo, e pode criar uma consciência individual, baseada em valores morais. Isso, em tempos de políticas coletivistas, tornou-se extremamente ameaçador.
Demonstrando que o jardim de Epicuro é o das aflições e angústias humanas, da vida caótica e desprovida de propósito – Olavo vai avançando e provando que grande parte das ideologias modernas e dos equívocos da atualidade, encerra-se nesse pensamento.
O comunismo e todos os outros sistemas que venham a colocar o Estado no centro de tudo, removendo Deus, para colocar a figura do órgão centralizador, a quem se deve obediência e submissão, valem-se justamente das ideias germinadas em Epicuro, Desenvolvidas por Hegel e cristalizadas por Marx. Olavo ainda adentra a era do imperador Cesar, demonstrando que a centralização de poder e de pensamento é um ideal antigo...
O jardim prometido por Epicuro oculta, em meios às sombras dos prazeres desmedidos e da individualidade desnorteada, um oceano de aflições , que desagua no caos e na destruição dos valores morais, da família e da religião, no Estado totalitário e na obediência cega dos cidadãos, no globalismo e na defesa de ideologias absurdas e de pautas desconstrutivas da sociedade.
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