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    Erika Figueiredo - Filosofia de Vida

    Dinheiro não é tudo

    Publicado 22/10/2021 às 0:22 | Atualizado em 22/10/2021 às 0:33 | Autor: Erika Figueiredo
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    Imagem ilustrativa da imagem Dinheiro não é tudo
    |  Foto: Pedro Conforte
    Essa é a motivação da série sul coreana Round 6, atual febre entre os adolescentes. Foto: Arquivo/Pedro Conforte

    Essa é a motivação da série sul coreana Round 6, atual febre entre os adolescentes, à qual fui assistir justamente para entender a razão desse sucesso. Como os nomes dos personagens são impronunciáveis e dificílimos de guardar e escrever, vou identificar o protagonista como jogador 456, modo como é chamado.

    A trama se desenrola a partir de convites em papel cartão, que são entregues a pessoas cuja especificidade é uma só: estão todas endividadas e sem alternativas, prestes a sofrerem execução fiscal, decretarem falência, serem presas ou mortas, pelas dívidas contraídas.

    O teor dos convites é extremamente atraente: caso aceitem participar de seis rodadas de jogos, em sendo vencedores, receberão uma gorda soma em dinheiro, suficiente para que saldem seus débitos .Muitos aceitam e assinam, assim, suas sentenças de morte.

    A série traz as narrativas de vida dos personagens principais, meio que para justificar esse aceite, destacando-se o jogador 456, em sua tragédia pessoal. Pai de uma filha de dez anos, cujo sustento relega ao padrasto e filho de uma senhora idosa e gravemente doente, este homem é o retrato da falência moral: deve uma fortuna a agiotas, é viciado em corridas de cavalo e outros jogos de azar, vive fugindo de seus cobradores, engana a criança, rouba dinheiro da própria mãe.

    Ao ser convidado para participar dos jogos, não hesita em dizer sim, sendo levado, juntamente com outros 455 participantes, para uma ilha deserta e desconhecida. Nesta ilha, as regras dos jogos são explicitadas: a cada rodada, os que perderem serão mortos. Há um termo de renúncia à integridade física, obrigatoriamente assinado por todos. É possível desistir e ir embora, caso esse seja o desejo da maioria. E isso ocorre, de fato. Todos vão embora. Mas a esmagadora maioria, após confrontar-se com a realidade de suas vidas fora da ilha, decide regressar.

    Num ambiente em que cada morte representa mais dinheiro para os sobreviventes, vale tudo. Assassinato, traição, ameaça, medo, dor e sofrimento estão, lado a lado, convivendo com a cobiça de todos. Afinal, o principal objetivo é tudo suportar e sobreviver, saindo dessa milionário. E esse é o grande mote da estória: ficar rico a qualquer preço vale à pena? E em caso negativo, por que?

    Para que possamos falar de modo claro sobre valores inegociáveis, é preciso, primeiramente, compreender que há dois tipos de apetites, aos quais o ser humano é exposto, e que diferenciam-no dos demais seres vivos. Por ser capaz de manifestar vontade, o homem pode sentir-se atraído por uma série de bens. É, entretanto, na natureza desses bens, que reside a diferença vital.

    O apetite concupiscível é aquele que temos por bens materiais, por objetos e produtos, coisas que podemos adquirir. Pode ser voltado para o dinheiro, para comidas e bebidas, itens de consumo em geral. Posso desejar um carro ou um belo jantar regado a um bom vinho, posso querer a bolsa de marca ou a casa de praia: tudo isso faz parte desse apetite, que é o primeiro a manifestar-se nos seres humanos.

    O apetite concupiscível, é o que faz com que muitos acreditem, firmemente, que tudo na vida gira em torno de dinheiro, pois é, através deste, que podem ser obtidos todos os demais objetos de desejo. E quantos de nós não somos assim? Interessados somente na matéria e no que o dinheiro pode comprar? Dispostos a tudo por uma boa grana?

    Acontece que, além da vontade, o homem possui a capacidade de reflexão, o entendimento das coisas da vida e o raciocínio, dons concedidos tão somente a nós, pela divina providência. E é aí que entra o questionamento acerca de até onde se deve ir por dinheiro.

    Irascíveis são os bens imateriais. Por não serem bens que adquirimos com dinheiro ou favores, são bens de difícil obtenção. Aqueles bens que dependem de aprimoramento moral e de aperfeiçoamento da personalidade do ser humano, os quais não se podem comprar, e que advém dos valores morais que possuímos, e das virtudes que ostentamos, são os incluídos nesta categoria.

    A partir do momento em que vai tendo que abandonar seus valores (que até ali são bem poucos), para disputar o dinheiro acumulado do prêmio, o jogador 456 percebe que não consegue desejar aqueles milhões, à custa da desgraça alheia, e que não dá pra apagar todo vestígio de escrúpulo, caridade, compaixão, bondade e solidariedade que possua, para alcançar o seu fim.

    O apetite irascível só pode surgir, na vida de cada um, assim: com a lucidez que o conhecimento das virtudes traz. Somente aquele que é capaz de perceber a importância do aprimoramento da personalidade e das virtudes pessoais, mesmo em meio ao caos, tem condições de abrir mão de bens materiais e passageiros, em prol de bens elevados e permanentes.
    Somente o apetite irascível cria a chance de livrar-nos do vazio e da falta de sentido de nossas existências, em busca de propósitos maiores e admiráveis, que nos salvam como seres humanos. Somos falhos, e apenas o cultivo das virtudes pode nos melhorar como indivíduos.

    Então, se você é daquelas pessoas que acreditam firmemente que vale tudo para ganhar mais dinheiro, possuir mais bens e alcançar mais símbolos de status na sociedade, pergunte-se, com sinceridade, se nada mais lhe restasse no mundo – amores, amizades, filhos, família, saúde, religião, paz, equilíbrio interior, propósito de vida – esses bens concupiscíveis dariam conta de suprir o vazio da sua alma?

    Existe um ditado antigo que diz o seguinte: tudo que o dinheiro pode dar conta de resolver, não é um verdadeiro problema. O dilema começa quando o vazio é a ausência de tudo que não se pode comprar. Quando os ativos necessários são imateriais, apenas as virtudes e os valores morais são capazes de alcançá-los.

    Se nenhum bem material lhe restar, sempre será possível valer-se da força da sua personalidade. Ela te apontará o caminho a seguir, e todos estes poderão ser reconquistados. Contudo, se você não conquistar os bens elevados de uma existência, nenhum outro será suficiente, a fim de suprir as suas faltas mais profundas e fundamentais.
    Em uma sociedade corrompida como a nossa, Round 6 faz sucesso por trazer verdades que não gostamos de confrontar .

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